Nesta semana, foi julgada em João Monlevade, uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral que apurou fraude à cota de gênero nas eleições 2024, em decorrência de uma candidatura feminina fictícia. O caso veio a juízo para que se apurasse se determinada candidata registrou fraudulentamente sua candidatura, sem real intenção de concorrer ao pleito. As suspeitas vieram diante de sua votação zerada, inexistência de atos de campanha e ausência de prestação de contas. A sentença foi procedente, entendendo que de fato a referida candidatura foi fictícia para fraudar a cota de gênero de determinado partido monlevadense.
Entende-se por cota de gênero o percentual mínimo de 30% de candidaturas femininas que todo partido tem que cumprir. Isto quer dizer que dos 16 candidatos que cada partido de João Monlevade pôde lançar em 2024, ao menos cinco teve quer ser mulheres. Por questões históricas, os partidos têm dificuldade para encontrar mulheres candidatas, daí a razão de se obrigar o cumprimento dessa cota de gênero, no intuito de se revelar, ainda que por força de lei, novas lideranças femininas.
Pensando que somente em 1965 o voto feminino tornouse obrigatório em nosso país, essa exigência surge como forma de recompor essa dívida histórica que a sociedade patriarcal deve ao gênero feminino. Dessa forma, a legislação eleitoral vem incentivando cada vez mais essa integração de mulheres na política. E, a cada eleição, vem punindo com mais rigor fraudes em prejuízo às candidaturas femininas.
O fato é que, desde a criação da cota de gênero, tem-se registrado que muitas mulheres são convidadas para se candidatarem apenas para cumprir a cota. Ou seja, tornam-se candidatas fictícias para proporcionar que mais homens consigam uma vaga de candidato. É preciso inibir e punir essas fraudes com rigor, a fim de diminuir o abismo histórico entre a participação masculina e feminina na política.
Por isso, em maio de 2025, o TSE aprovou uma súmula, estabelecendo critérios objetivos para se apurar a fraude: votação inexpressiva, prestação de contas zerada ou padronizada e ausência de atos efetivos de campanha. As penalidades definidas foram muito rigorosas, como cassação de todos os candidatos e eventuais eleitos do partido, inelegibilidade dos que praticaram ou anuíram com a fraude e nulidade de todos os votos dado à legenda.
No caso da candidata de João Monlevade, o Juiz Eleitoral entendeu que todos esses requisitos foram preenchidos, razão pela qual julgou a ação procedente para anular todos os votos do seu partido nas eleições 2024 no município. O juiz ainda declarou a sua inelegibilidade por oito anos e determinou a recontagem dos votos.
É importante frisar que as consequências de uma decisão desse quilate vão muito além da candidata fictícia ou da cassação de eventual candidato eleito desse partido. Ela pode vir a atingir qualquer vereador eleito, independentemente do partido, porque a anulação de votos implica em recontagem. Com isso, um novo cálculo será feito, podendo vir a mudar o resultado de uma eleição, com a redistribuição das vagas de vereador.
O partido em questão não teve candidato eleito. Mas, com a anulação dos votos dados à sua legenda e a todos os seus candidatos, altera-se o quociente eleitoral – votos válidos dividido pelo número de cadeiras a se ocupar.
Na prática, não haverá mudanças significativas no resultado em João Monlevade, mas só porque o partido fez poucos votos. Mas, fica o alerta: uma candidatura fictícia põe em risco a candidatura de qualquer dos eleitos e de qualquer dos partidos. Candidatura feminina é coisa séria. E assim deve ser tratada por todos os envolvidos no processo eleitoral, independente de que gênero for.
(*) Hortência Carvalho é chefe do Cartório Eleitoral de João Monlevade