Ganhar uma medalha olímpica é um feito extraordinário para qualquer competidor, isso é fato. Quando se trata de competidores que têm antagonismos enormes a enfrentar, pela origem; pela miséria; pela falta de apoio ou patrocínio; pelas deficiências que tornam, muitas vezes, o próprio corpo um adversário, então é necessário olhar para muito além das provas.
Estar numa competição mundial desse porte, por si só, já é desgastante, estressante e altamente desafiador. Alguns dos atletas competem com a ajuda de familiares, amigos, rifas, vaquinhas, ou até venda de bens conquistados com grande esforço, para pagar as diversas despesas, inclusive, às vezes, até o equipamento de treino ou de competição. Tudo isso exige um esforço tremendo e um elemento sem o qual nada aconteceria que valesse ser mencionado: amor.
Ariosvaldo Fernandes, nordestino de Campina Grande – Paraíba, é um desses personagens que alteram nossa percepção acerca do que é ser competidor, atleta, PcD, ser humano por excelência. Aos 47 anos, quando a imensa massa de atletas já se dedica a outra atividade em razão da idade, esse guerreiro inverte a ordem das coisas e ganha sua primeira medalha olímpica numa modalidade que exige muito do competidor. Mais do que tudo isso, esse brasileiro, exemplo de vida e de resiliência, produz as próprias cadeiras de rodas, com baixíssimo orçamento e com disposição de herói.
Usando o material disponível, se arrastando no fim da fila da tecnologia, ainda assim conquistou uma medalha contra competidores com equipamentos de última geração. Não é um feito qualquer. Principalmente quando se tem a notícia de que, na noite anterior, trabalhou até alta madrugada para tentar solucionar o problema na cadeira de rodas de uma colega, também brasileira, Jéssica Messali, que disputava o triatlo adaptado e, infelizmente, teve que abandonar a competição por falta de equipamento. E o Ariosvaldo ainda demonstra frustração e tristeza, por não conseguir seu intento, mesmo sem ferramentas adequadas nem peças de reposição. Foi uma noite de insônia.
O gigantismo moral e ético do atleta deveria servir de exemplo, especialmente para aqueles que têm o poder de mudar as condições de vida das pessoas, pelo poder econômico ou político.
Acredito que quem teve a honra de conhecer e conviver com esse atleta maior, alcunhado carinhosamente de Parré, pode cantar orgulhosamente com o “rei” Roberto Carlos, sem qualquer receio: “Você meu amigo de fé, meu irmão, camarada; amigo de tantos caminhos e tantas jornadas;”
E fez-se história, com o bronze mágico do magnífico Parré. O Brasil brilhou dourado mais alto no pódio por 25 vezes, ou seja, cinco vezes a mais que a soma de todas as 20 medalhas do Brasil, conquistadas nas olimpíadas desse ano. No total trouxeram 89 medalhas, sendo 25 de ouro, 26 de prata e 38 de bronze. Um recorde que colocou o Brasil na quinta colocação geral. Mesmo com pouco patrocínio, com parte dos custos que envolvem a competição sendo bancados pelos próprios atletas, a glória e o sucesso abraçaram nossos heróis PcD.
Quantas pessoas tomaram conhecimento desses feitos? Quantas tomarão?
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