Havia, sim, muita dificuldade em trazer público aos eventos de basquete em cadeira de rodas. Naturalmente, nos ressentíamos do fato, porque imaginávamos que tinha que ter valor aquele esforço todo. Afinal, se acertar a cesta de pé, por aqueles atletas gigantes é um grande desafio, imagine fazer isso sentado, sem poder saltar e ainda ter que controlar a cadeira, como se caminhássemos em um piso escorregadio. Não era brincadeira.
As competições eram acirradas, com quedas de cadeira e condutor, bastante plásticas. Mas o retorno à posição natural era outro espetáculo. Especialmente, quando a PcD tinha braços longos e fortes, erguendo a cadeira como uma extensão do corpo, impulsionando para mais uma disputa de bola, um ataque, uma defesa. Muita adrenalina naquelas corridas, derrapagens, dribles fantásticos. Algumas jogadas de passe em que o atleta dá impulso e arremessa a bola por trás da própria cadeira, com habilidade e força suficientes para cruzar a quadra e alcançar outro cadeirante desmarcado no garrafão. Um espetáculo impagável pela beleza, habilidade e técnica apurada.
E o que dizer dos arremessos? Pura magia. Ainda que sem plateia, a sensação de quem lança a bola ao cesto é quase sempre de estar num caldeirão. Numa analogia simples, um jogador comum normalmente tem as mãos, ou até a própria cabeça em altura alinhada ou próxima à da cesta.
O paratleta vê a cesta bem mais alta, como se arremessasse a bola para as mãos do infinito. É pura emoção. Como se o pilar que suporta a bandeja assumisse, por encanto, a forma de uma colher imensa promovendo a mágica mistura borbulhante de rodas, braços, suores, acidentes, sorrisos e glórias.
Numa conversa ao fim de uma partida, no ginásio da AMP, hoje Poliesportivo Deputado João Batista de Oliveira, a questão foi levantada e alguém analisou que, talvez, o problema se resumisse em que aquilo não era sonho de pais para seus filhos; exceto, claro, se também fosse PcD. No entanto, atualmente, vemos estádios lotados nas paraolimpíadas. Isso nos enche de orgulho. Houve o caminho que percorremos, resilientes, como numa corrida de revezamento. Nossa digna realização é saber que entregamos o bastão para aqueles que nos sucederão em melhores condições do que recebemos. Muitos de nós, no início, usávamos cadeiras comuns para jogar. Comparado aos atuais equipamentos, era como se um time de futebol entrasse em campo com chuteiras de última geração e o outro calçando botas galocha PVC.
Jogo treino. Nos esforçávamos para merecer a titularidade do jogo efetivo. Nem sempre a habilidade caminhava pari passu com as desenvolvidas musculaturas de alguns ombros e braços. Num momento de excesso, uma roda se soltou e a cadeira adernou para a esquerda, sem que o que vinha rápido de trás, esperando um passe, tivesse tempo de parar. A batida e o capotamento foram inevitáveis.
Outros três atletas foram atingidos. Formou-se um amontoado de cadeiras, enquanto a bola, perdida, quicava em direção ao fundo vazio da quadra… Ninguém se feriu gravemente, mas foi um quebra-quebra daqueles nas cadeiras!