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13 de Maio de 2022
Por dia, são transportadas em média 21,5 mil pessoas - Índice de passageiros em Monlevade é maior que média do estado de Minas
Julieta Bittencourt
Transporte público em Monlevade está sendo avaliado

Por dia útil em João Monlevade, são transportadas, em média 21.587 pessoas nos ônibus, em 587 viagens. O número é considerado razoável, embora aos domingos, a quantidade caia para 287 viagens. Além disso, o índice de passageiros por quilômetro no município é de 1,77, maior que a média do Estado (1,72 em 2019). A média de usuários por viagem de ônibus é 26 pessoas, número que quase dobra, chegando a 44, quando considerada a linha 30 (Estrela Dalva – Hospital). 
As informações são do consultor Ricardo Medanha, representante da Cidade Viva Engenheiros e Arquitetos, durante audiência pública na Câmara Municipal, realizada no fim do mês de abril. A empresa é responsável por um mapeamento das condições do trânsito em João Monlevade, cujos dados serão usados para elaborar edital de nova licitação do transporte público na cidade. Com o mapa, o objetivo é encontrar novo modelo de concessão, adequado à realidade atual da cidade, aumentando a qualidade do serviço ofertado ao cidadão. 
A estimativa é que em breve, seja publicado o edital para o início do processo licitatório. O contrato da Enscon Viação Ltda, atual empresa concessionária do transporte coletivo, se encerra no fim de julho. A licitação terá dois lotes, um para o transporte coletivo e outro para o transporte escolar. Conforme Medanha, o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE/MG) têm recomendado o modelo de maior desconto na tarifa para selecionar a empresa gestora do transporte público nos municípios.


Raio x 

Conforme informado na audiência pública, a empresa levantou os dados através de “Pesquisa Origem-Destino” para estudar como a população de Monlevade se desloca e para quais locais. Para tanto, o estudo dividiu o município em 37 áreas, agrupadas em 19 regiões. Desta forma, foi mostrado que 53% dos usuários do transporte público vão para ou deixam a parte central da cidade. Outras origens ou destinos mais usados dos monlevadenses são as regiões do Cruzeiro Celeste e bairros no entorno da ArcelorMittal e do bairro Satélite.  
Atualmente, o transporte coletivo de João Monlevade conta com 24 linhas principais, que se dividem em 434 “sublinhas”. Essas são pequenos desvios de trajeto aplicados em alguns horários no mesmo itinerário do ônibus. Na opinião de Medanha, esse número de “mudanças de rota” é exagerado e precisa ser revisto. Também foram expostas pelo consultor, diversas informações sobre horários, condições dos abrigos, estudo de demandas, regimentos, regras, adequações às novas realidades, capacidade de gestão da concessionária, tecnologia aplicada, regulamentação, sistema inteligente, tráfego, entre outras. 

Qualidade 

As demandas de João Monlevade não diferem de outras cidades brasileiras quando o assunto é o transporte público coletivo. Qualidade do serviço ofertado, cobrança por frota nova, críticas à superlotação em horários de pico, lentidão dos carros, horários, entre outras estão entre as principais reclamações recebidas pelo A Notícia por parte dos usuários. 
Até o diretor da Enscon, Eduardo Lara, reconhece a importância da qualidade. “As discussões sobre a licitação do transporte público em João Monlevade não podem enfocar apenas no preço, mas principalmente na qualidade do serviço”, disse ao A Notícia. Segundo ele, embora o valor da tarifa seja um fator importante, a preocupação maior do monlevadense é de que o serviço de ônibus seja bem prestado. Em sua opinião, mais do que com o preço da passagem, o usuário está mais preocupado se terá de esperar muito tempo no ponto de ônibus, se ele terá de viajar de pé ou se o ônibus passará no horário correto e se estará limpo. 

Preço da passagem

Todos os anos, em época de reajustes, os debates acerca do preço da passagem ganham destaque, sobretudo, por reclamações dos usuários. Hoje, a tarifa custa R$4,00 paga em dinheiro e R$3,80 para quem usa o Ensconcard. E é justamente desses valores que vem o custeio do serviço. Especialistas afirmam que, em um primeiro momento, o modelo pode fazer sentido, mas é questionado. Isso, porque para uns, é injusto que o passageiro pague sozinho por um serviço que beneficia toda a sociedade. Para outros, a questão é mais pragmática: com a queda do número de usuários, o valor da passagem acaba subindo. E aí, surge um impasse. Por outro lado, com o aumento, menos pessoas conseguem pagar, ou se interessam em usar os coletivos, o que leva à necessidade de um novo reajuste, gerando um ciclo insustentável.
Outras questões afetam diretamente no preço da passagem, como as gratuidades, por exemplo. Segundo o consultor Ricardo Medanha, em Monlevade, o número de passageiros que não pagam a passagem passa de 24% de todos os usuários, número bem maior que a média mineira, que é de 16%. Esse assunto já foi tema de debates na Câmara Municipal e de outras audiências públicas. Isso, porque o custo do passageiro que pode viajar de graça é rateado pelo restante dos usuários pagantes.
Muitos têm o direito legal a viajarem de graça. Assim, mesmo um passageiro de renda baixa, por exemplo, acaba “pagando” por um idoso de 65 anos, de classe alta, que tem o direito assegurado por Lei Federal. Além disso, em Monlevade, há outras formas de gratuidade concedidas por legislação municipal: Integrantes do Sevor, a caminho de resgates, aposentados de baixa renda a partir dos 60 anos, deficientes, entre outros. 

Subsídio público

Esse modelo em que o usuário é quem paga os custos do transporte, destoa do praticado em alguns países da Europa, onde a receita tarifária, paga pelo passageiro, cobre menos da metade dos custos. O restante vem de subsídios públicos e impostos específicos, entre outras fontes. E é justamente o subsídio público, a principal alternativa à dependência da receita tarifária. Mesmo que isso contrarie a muitos. 
Em agosto do ano passado, o assunto rendeu polêmicas e discussões na cidade, quando a Prefeitura de João Monlevade anunciou a concessão de R$350 mil mensais por seis meses à Enscon, totalizando R$2,1 milhões. Os recursos foram justificados como forma de evitar aumento da passagem e garantir os serviços, afetados durante a pandemia. Em fevereiro deste ano, o subsídio foi renovado por igual período, também evitando reajuste e segue em vigor. 

Prefeitura gasta R$12 milhões por ano com transporte

Segundo o Portal da Transparência da Prefeitura de João Monlevade, a despesa anual com o transporte público na cidade é R$12 milhões. Nesse valor, estão as despesas com o fornecimento de vale transporte, por meio de crédito em cartão magnético para os servidores (quatro passagens diárias), e custos de Programas Municipais da Secretaria Municipal de Educação. Entre esses, está o Rota Escolar, que transporta estudantes de escolas públicas ao custo anual de quase R$5 milhões: R$4.952.421,44.
Desafios

Por essas questões, o futuro do transporte público em Monlevade é desafiador e passa pela necessidade de revisão, diante da licitação que será realizada em breve. Estudos apontam para a necessidade de se criar receitas com tributos específicos e a revisão de incentivos fiscais, como alternativas à dependência da tarifa paga pelo usuário, sistema vigente em Monlevade.
O próprio consultor Ricardo Medanha afirma que a tendência nacional é que as tarifas pagas pelos passageiros não sejam suficientes para bancar os custos do transporte público. A pandemia explicitou o problema, com a redução do número de passageiros e necessidade da Prefeitura custear os serviços com os subsídios concedidos para evitar o aumento da passagem no bolso do cidadão.

Movimento Tarifa Zero

Um dos modelos alternativos seria o Tarifa Zero, quando outras formas de financiamento pagam as despesas, sem cobrança dos cidadãos. Os defensores do movimento se baseiam no artigo 6º da Constituição Federal, que trata do transporte coletivo como um direito social. Portanto, as pessoas não deveriam ser cobradas para usar o transporte. 
As despesas com os ônibus ficariam a cargo de outras fontes. Como exemplo, está o pagamento integral pela Prefeitura, que assumiria todos os custos; aumento do Imposto Territorial Predial Urbano (IPTU) para pessoas de maior renda e uso desses recursos para os custos do transporte;  a cobrança de uma taxa anual da população destinada ao transporte público; parcerias com grandes empresas (que poderiam ser beneficiadas ao reduzirem gastos com vales transportes de funcionários, destinando um valor menor ao setor); veiculação de publicidade em abrigos ou dentro dos ônibus, entre outros.  
Segundo o professor Elizeu Assis, um dos defensores do movimento, o Tarifa Zero não é simplesmente zerar a tarifa, mas adotar outra lógica para a Mobilidade Urbana. “Todos saem ganhando: o município passa a ter controle sobre o serviço; o cidadão economiza; no comércio, circularão mais pessoas e, por conseguinte, mais compras e mais dinheiro no município; a concessionária do transporte público não terá que se preocupar com a sazonalidade de usuários, pois será remunerada independentemente do número de passageiros que transportar”, afirma Elizeu. Outro benefício defendido, seria a redução de veículos, melhorando condições de estacionamento.
Conforme Elizeu, Monlevade, a exemplo da cidade de Caeté, que implementou o sistema recentemente, também tem condições, já que o número de habitantes é parecido.  “A tarifa zero, como política pública é do interesse de toda a sociedade, por garantir acesso à cidade, melhorar a circulação dos cidadãos e reduzir a desigualdade social”, afirma. 

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