O Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC) surgiu em 2017 em resposta ao banimento das doações de pessoas jurídicas às campanhas eleitorais. A mudança da origem dos recursos, de privado para público, fez mudar todo o trabalho da classe política para captar recursos financeiros. Se antes o importante era o lobby político com as grandes empresas com interesses na contratação futura com o setor púbico, agora, o que conta é a influência política das lideranças partidárias locais junto a sua legenda.
O objetivo da mudança foi tirar do cenário da administração pública o comprometimento dos vencedores com as empresas que financiaram sua companha, dando autonomia nas contratações públicas e maior transparência aos processos licitatórios. Também, o objetivo era proporcionar melhor equalização de recursos a serem distribuídos dentre os partidos. Para isso, criou-se regras de distribuição conforme representatividade do partido na câmara de deputados e quotas de gênero e raça.
Passadas quatro eleições com campanhas pagas com dinheiro público, já é possível visualizar seus efeitos práticos na dinâmica da disputa às urnas.
Quanto ao equilíbrio econômico percebe-se que a concentração financeira de recursos foi dada a candidatos mais viáveis eleitoralmente, até porque é a quantidade de cadeiras que o partido ocupa na câmara de deputados e no senado que determina o percentual que irá receber do FEFC.
A questão começa a chamar atenção quando se percebe que não há sequer critérios para a fixação do valor do Fundo. Assim, de 1,7 bilhão em 2018, o FEFC saltou para 4,96 bilhões em 2022, valor repetido nas eleições municipais. Esse aumento vertiginoso já acendeu o sinal de alerta para se perguntar: quanto de dinheiro é preciso para se fazer uma campanha eleitoral? Se o dinheiro agora é púbico, o parâmetro deveria ser o mínimo, e não o máximo.
O que se viu, na prática, dentro das esferas partidárias, foi uma distribuição de recursos conforme conveniências político-eleitoreiras, sem critérios pré-definidos, até porque não há regramento legal na divisão do fundo pelo partido. Ele distribui o dinheiro como bem o convir. Seria esse o melhor caminho, pensando que o dinheiro veio no intuito de proporcionar uma disputa mais equânime? Como fazer surgir novas lideranças se o dinheiro é distribuído conforme a vontade dos que já estão no poder?
Outra questão que merece destaque é a forma de se gastar o recurso público. A atual legislação exige que se apresente o documento fiscal de todo gasto eleitoral pago com recurso do FEFC. Apenas isso! Não há limite de contratações – exceto com números de militantes contratados. Não há critérios de valores, de orçamentos prévios, de limites por tipo de despesa, ou seja, o recurso entra no caixa do partido como público e se gasta como se privado fosse.
Não se exige sequer a comprovação de que a contratação esteja nos patamares de valores praticados no mercado. O candidato/partido gasta o recurso da forma que lhe convém. Desde que apresente a documentação fiscal própria, o gasto está regular. Sem critérios objetivos e limites nas contratações, fica muito mais difícil apurar abusos ou até mesmo uso indevido dos recursos públicos recebidos.
O problema é que temos uma legislação eleitoral ainda moldada num financiamento privado, centrada no limite de gastos como forma de se apurar abusos. Agora que o Estado é o principal provedor das campanhas eleitorais, é preciso moldar o regramento para moralizar o rateio do fundo e a forma de se gastar o recurso.
Pensando no volume de dinheiro público que está sendo empregado nas campanhas brasileiras, chegou a hora de apertar as regras para o financiamento público das campanhas eleitorais. Se o dinheiro é público, seu gasto deve ser regulamentado por normas mais rigorosas, à semelhança de qualquer gasto público, sob pena de se ver o dinheiro escoando, mais uma vez, nos ralos da corrupção. Não deixemos que o financiamento público descomedido seja um mal ainda maior do que foi o financiamento empresarial das campanhas do passado.