(*)Mário Ananias

Estávamos ansiosos pelos preços que seriam praticados na cantina da Escola Tecnica. Provocáramos um movimento dos alunos reivindicando melhores preços, uma vez que aquele estabelecimento não arcava com os custos dos comércios locais. Água, luz, aluguel, entre outros. Parecia injustificável praticar preços padrão de mercado. A proposta era repassar aos usuários a redução dos custos, minorando os preços para contemplar alunos, professores e servidores. O proprietário descumpria, frequentemente, os preceitos de uma parceria digna com a administração da Escola.

Antes do tempo em que fui discente, havia distribuição gratuita de lanches aos alunos. Programa bem administrado para fornecer alimentos a todos os alunos, especialmente àqueles das classes menos aquinhoadas, aqueles que vinham do interior ou de outros estados e viviam nas muitas repúblicas estudantis em redor do enorme prédio situado no bairro Gameleira, na avenida Amazonas. Uma curiosidade sobre essa construção é que teria sido projetada para abrigar um presídio feminino, mas, por questões político-administrativas foi aproveitado para instalação da ETFMG. O terreno imenso foi adequado às muitas salas de aula, áreas administrativas, oficinas, laboratórios, quadra esportiva e estacionamento.

Quanto ao lanche, foi abolido, entre outras causas, pelo fato de que alguns alunos, por não conseguirem entender a extensão daquele benefício a tantos alunos carentes, promoveram ações equivocadas. Entre elas, usar o alimento como bola a ser jogada entre alguns deles e descarte em nível de desperdício. Todas essas atitudes desmereciam o esforço direcionado a eles próprios. Naturalmente não eram maioria, mas eram em número suficiente para caracterizar um deplorável malfeito.
Nos organizamos num grupo ativo de alunos buscando convencer a outros tantos de que deveríamos evitar comprar naquela lanchonete. Poderíamos andar o equivalente a um quarteirão e nos tornarmos clientes de outros empórios ao redor da Escola. E talvez conseguíssemos – como de fato ocorreu – algumas promoções em razão do grande afluxo de pessoas.

Aquele meu sotaque mineiro de monlevadense, carregado por uma voz que sempre foi grave e consistente, ajudou a convencer muitos dos alunos. A ideia nem era causar quaisquer prejuízos ao comerciante. A conotação era bem mais ampla. Pretendíamos que, com preços mais acessíveis, muitos de nós que tínhamos apenas o suficiente para um lanche que substituiria o almoço, pudéssemos nos alimentar em nosso dia a dia.

O movimento que se iniciou numa segunda-feira, foi ganhando corpo com a adesão de mais e mais alunos. Alguns deles pelo oba-oba de integrar um grupo ativo. Um número bem mais expressivo de alunos, no entanto, entendeu o cerne da questão e, mais que participar, se empenhou em expandir aquela ação social. Na quinta-feira a administração da Escola já começou a se envolver no processo, tentando entendê-lo e ajudar a encontrar soluções. Foi então que o dono do quiosque me procurou. Ofereceu a mim, lanche gratuito por um mês, em troca de ajuda para encerrar a greve. Ele se espantou quando não aceitei:
“- Mas, por quê? É de graça!”
Resposta simples e objetiva, com base na criação que meus pais me deram:
“- Questão de princípios!”