(*) Mário Ananias

Na dúvida, pergunte. E ainda, com a mente aberta, avalie a resposta para constituir sua própria opção de atitude.

Domingo de sol, carona fácil dos amigos para um piquenique à beira do bonito lago em Várzea das Flores. Refúgio tranquilo para merecido relaxamento. Galera feliz, animada para curtir um dia de entretenimentos. Lanches e quitutes arrumados em bolsas, bebidas geladas na caixa de isopor. No destino seria fácil obter gelo para as bebidas, cervejas, refrigerantes, sucos; e também para preparar a boa e velha caipirinha, indispensável nesses eventos.

Iam Seajo, jovem, bem-apessoado, universitário, mas um tanto tímido, ainda se esquiva de oportunidades pela insegurança que sua deficiência, sequela de poliomielite, ainda lhe causa. Muitas PcD, por razões diversas, incluindo extremos de superproteção ou descaso, entre outros, se mostram arredios, constrangidos. Ou autoflagelados por acreditarem que sua constante necessidade de exigir de si total independência é frustrada, quando não conseguem tal façanha. Ainda bem que o acesso a informações tempestivas e de qualidade vem ajudando a melhorar esta relação com a sociedade. E já nem era sem tempo.

Os aproximados 25 quilômetros até o destino são percorridos logo cedo. Para pegar um bom lugar, antes de ficar lotado. Apesar de, a bem da verdade, a própria Kombi estar abarrotada. Todos espremidos, felizes, com sorrisos no rosto, cantoria nos lábios e movimentos constantes para se ajustarem entre tantos, inclusive o Iam que pela primeira vez encarava esta deliciosa aventura.

Montou-se a pequena mesa de camping, seis cadeiras tubulares, cordas de náilon trançadas, e três câmaras de ar grandes começaram a ser enchidas com a força de pulmões, inclusive pelo radiante Iam.

Livres das roupas comuns que cobriam as de banho, começa o fluxo à convidativa água.

As boias improvisadas oferecem um passeio mais longo, afastando os corajosos da segurança da orla. Quanto sorriso, quanta alegria e despojamento naquelas brincadeiras na água.

Então, veio o convite ao Iam:
– Vem! A água está uma delícia.
– Ah! Não. Eu não sei nadar!
– Não tem perigo. Eu te ajudo a entrar na boia.
– Ah! Acho melhor, não.
– Que bobagem. Você vai perder? Até as crianças podem brincar. Vem.

Vencido. Com satisfação!

Sorrisão cheio de dentes, braços e ombros poderosos em contraponto às flácidas, inseguras, atrofiadas pernas.

Auxiliado, o Iam foi colocado na boia artesanal e afastado um pouco da beirada. Momento mágico. Ver a praia da água era um espetáculo novo, ímpar.

A diferença de peso entre o tronco desenvolvido e as pernas raquíticas fez com que a boia “capotasse” e o Iam, leigo em natação, se apavorou e tentou, desesperadamente, voltar à posição natural batendo as mãos e, de vez em quando, voltando à superfície. O tempo era mínimo à flor d’água e seu grito era monossilábico antes de voltar à posição de mergulho a meio corpo.

As crianças vibravam e correspondiam felizes ao que imaginaram ser uma brincadeira e acenos do Iam. Levou algum tempo até que uma moça, atenta, percebeu que não era brincadeira. O Iam estava se afogando.

Ainda bem que não demorou a chegada do socorro e tudo não passou de um susto. Atualmente, os presentes àquele episódio, inclusive o Iam, riem muito do ocorrido: ele se erguendo aflito e as crianças imitando o gesto a brincar.

Mário Ananias é monlevadense, servidor público, escritor, palestrante e autor do livro: Sobre Viver com Pólio. Contato: mariosrananias.com.br/