(*) Cefas Alves Meira
A Rede Globo vem veiculando já há algum tempo vídeos institucionais, tratando dos bastidores da emissora. Querendo maior aproximação, maior intimidade com o telespectador, sua razão de ser. Em um desses vídeos ela colocou na tela a palavra piloto. E esclarece o telespectador: não é apenas quem conduz o avião. Na Globo é um projeto que se inicia, um novo seriado ou primeiro capítulo de novela, que vai para avaliação de um grupo de pessoas, visando corrigir possíveis falhas, fazer ajustes, maior qualidade enfim.
Piloto nos meios, um termo antigo, de décadas, ainda utilizado nos veículos de comunicação eletrônica ou impressa. E não sei porque cargas d’agua, esses vídeos da Globo me levaram a cinco décadas atrás, eu estagiário do jornal “Diário da Tarde”, vespertino e irmão caçula do veterano “Estado de Minas”. O DT já não existe, foi substituído pelo tabloide “Uai’, que não é nem a sombra, em conteúdo, tiragem e volume de leitores, do antecessor.
O “Diário da Tarde” circulava de segunda a sábado, enquanto o tradicional EM chegava às bancas e assinantes de terça a domingo. Na segunda o leitor era premiado com um DT volumoso, notícias de política, economia, locais, e uma cobertura detalhada de todo o futebol mineiro, capital e interior, e até mesmo os principais jogos do futebol de várzea. E todo bairro tinha seu time, seu campo, onde ocorriam os festivais comemorando o aniversário do clube. Festança, jogos a partir do início da manhã indo até o sol se pôr – era a “Prova de Honra”, entre a equipe titular da casa e um visitante ilustre.
No DT das segundas, a imperdível página de humor Bitoque, escrita por Augusto Rocha, o Carioca, e ilustrada pela arte do fenomenal Radik. Ambos já falecidos, o tempo é implacável. Piadas inteligentes, picantes, mas sem cair no baixo nível. Eram no estilo “piadas de salão”, termo usado na época, e estou falando das décadas de 1960, 70 e até 80. Pois bem, mas chega de lenga-lenga. “Vamos deixar de entretanto e vamos pros finalmente”, como diria Odorico Paraguassu/Paulo Gracindo, de o “Bem Amado”.
Não aconteceu comigo, mas poderia. E podem ter certeza que assumiria, neste espaço do A Notícia. Tenho orgulho daqueles áureos tempos. Mas vamos aos fatos. Um outro estagiário foi chamado por um veterano da editoria em que o rapazote trabalhava.
– Aqui, vai na gráfica e traz uma calandra pra mim. Preciso concluir um texto.
O estagiário vai ao porão, onde era a gráfica, onde centenas de funcionários – os gráficos – trabalhavam. Todos de macacão, devido à tinta que inundava o maquinário pesado, utilizado na impressão dos jornais.
– O chefe lá em cima pediu para eu buscar uma calandra. O gráfico, experiente e já curtindo a presa, falou pro rapaz: “Procura lá no final do corredor. Tá na gaveta do Alfredo!”
O estagiário vai, pergunta pro Alfredo. “Ih, esqueci em casa. Pergunta pro Nelson, deve ter”. O Nelson balançou a cabeça negativamente. E apontou o chefe da seção. Só com autorização dele. E lá vai o filhote de jornalista, aflito, pedir a calandra ao gráfico sênior.
A essa altura toda a equipe havia se levantado, formando uma imensa roda ao redor do estagiário e do chefe da seção. Que apontou na direção de um enorme jogo de cilindros, junto às rotativas, por onde milhares de jornais estavam sendo impressos. Era a calandra, pesando toneladas.
A turma caiu na zuação, batendo palmas e apupando a mais nova vítima do trote. Hoje chamado pegadinha. Ou trolagem para as gerações infinitamente acima da minha!