Quando meu filho nasceu, contrariando previsões que intuíam a impossibilidade para alguém com a minha deficiência, me senti completamente realizado. Nessa época, ainda fazia grande sucesso a música “Tom Maior”, que o bom Martinho da Vila fez em homenagem à primeira gravidez de sua esposa. “Está em você, o que o amor gerou…”. E eu sempre cantarolava este samba cheio de emoção e boas expectativas. E pensava no que eu poderia fazer para que aquele filho tão esperado e tão amado desde a concepção, fosse realizado em seus mais importantes sonhos e, claro, bem mais feliz que eu.
Fomos muito felizes com tão grande presente que recebemos. Um menino forte, inteligente, bonito, mais alto que eu e de um coração doce e gentil. Para completar tamanha alegria, trouxe ao mundo um neto maravilhoso.
Nas conversas com outros pais e avós, percebo o brilho nos olhares, a esperança de que, com disposição e bem querer, seus rebentos se empenharão por um mundo melhor para todos. Isso reacende a convicção de que se trabalhamos e entregamos o bastão, como numa disputa atlética de 4 x 400 m, em condições melhores do que aquela em que o recebemos, nossos sucessores também o farão com galhardia.
Então, vem também à lembrança a música de sucesso do conjunto The Fevers, Mar de Rosas (1990), composta pelo americano Joe South, executada em versão brasileira de Rossini Pinto. Como na música, a intenção não é oferecer um mar de rosas sob um céu de brigadeiro, mas tentar prover os instrumentos e equipamentos para que não se afoguem em mar algum. Por isso a referência ao Martinho, “…vai ter que amar a liberdade, só vai cantar em tom maior…”, tem uma conotação tão ampla quanto o amor que pais, por excelência, dedicam aos seus filhos.
Causa estranheza a atitude de quem arremessa a própria filha, uma criança, de apartamento no oitavo andar, como ocorreu com a Isabela. Casos como esse vem ganhando notoriedade nos noticiários pelo volume e pelas irracionalidades mais torpes e cruéis que geram tais insanas atitudes.
A perda do contato; as demandas de trabalho e renda; a correria das grandes cidades; a frustração diante da própria incapacidade de superar obstáculos profissionais; as incertezas e inseguranças que a vida dispõe a todos, especialmente àqueles despreparados ou relapsos quanto aos aprendizados; são parte das tentativas de justificar tamanha brutalidade para com vulneráveis a quem se deve proteção. Países em desenvolvimento vivem essas realidades com mais frequência sem que, no entanto, países desenvolvidos estejam isentos. No caso dos desenvolvidos, se transformam em notícia internacional porque são inesperados, são incomuns. Nos outros, chegou-se a um ponto altamente preocupante, porque está se banalizando a vida, a violência e essas aberrações contra crianças. E a troco de quê? Com que propósito? A quem interessa?
Não sei com certeza as respostas. Sei do fundo do meu coração, que precisamos retomar o contato humano, as relações amistosas, o exercício da tolerância e a dignidade de, outra vez, cantar o amor.
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