(*)Mário Ananias

O Carnaval, como qualquer grande festa, tem sua tipicidade de costumes, de acordo com o local em que acontece. Espetáculos grandiosos como os desfiles do Rio e Recife; Trios Elétricos que se espalharam da Bahia para várias cidades; e os carnavais do interior, mais modestos, porém não menos deliciosos.

Em Nova Lima, por exemplo, no domingo pela manhã, o carnaval tradicional e muito alegre recebe o nome de Bloco dos Sujos. Parece que a história remonta aos tempos em que os mineiros que trabalhavam à noite na mineração de ouro, ao saírem do plantão, faziam uma despojada festa, sem sequer passar em casa após o expediente. Muitas vezes, a fantasia era o próprio uniforme, um tanto surrado e suado, mas sempre com muita disposição e alegria.

Muitas vezes, saíamos cedo de BH, logo após o desjejum, com ou sem fantasia, e seguíamos pelo Anel Rodoviário até a BR-040, virando à esquerda até o BH Shopping. Ali era só subir a MG-30 até o montanhoso centro de Nova Lima e aproveitar um carnaval irreverente e memorável.

Muita gente bonita, muita fantasia caricata, muita música envolvente como sambas antigos, marchinhas maravilhosas e até, de vez em quando, um ou outro frevo. Quem não teve a oportunidade de se jogar num evento desses dificilmente poderá entender o que é a felicidade em sua forma mais simples e, ainda assim, concreta.
Certa vez, estávamos ali, de riso largo e olhar atento às fantasias, às danças e, naturalmente, às belas moças cheias de encanto, enquanto bebíamos a cantar as letras com entusiasmo. Vi uma delicada mão estendida a mim, as unhas pintadas de um rosa bem clarinho, as pernas bem torneadas expostas por um short jeans cheio de fitas coloridas e lantejoulas com uma corda bem espessa à guisa de cinto.

Usava também um bustiê azul claro, enfeitado com estrelas brilhantes das quais pendiam mais algumas fitas coloridas. Na cabeça, uma coroa improvisada presa por “piranhas” aos longos cabelos claros e esvoaçantes. Tinha nos pés sandálias Fashion Bubbles, que ganharam fama por causa de uma novela, e mais fitas presas ao tornozelo.
Como estava com uma garrafa de whisky ao lado de uma caixinha térmica, de isopor, cheia de gelo, imaginei que aquela delicada mãozinha buscasse uma dose da bebida.
Ergui a garrafa enquanto pegava um copo descartável para servi-la. Nesse meio tempo, acabara de tocar Aurora (1941) de Mário Lago e Roberto Roberti, e começava a Turma do Funil (1956) de Mirabeau, M de Oliveira e Urgel de Castro, que voltava a ser um grande sucesso na interpretação de Chico Buarque.

Aquele rosto jovem e belo se aproximou com uma dobra lenta e sedutora do corpo em minha direção sem que eu pudesse desviar o olhar daqueles olhos claros que magnetizavam a direção dos meus. Coincidindo com o movimento sedutor, um sorriso irresistível se abria e ela, já bem perto, me disse, em tom confidencial: “Que bom que você veio. Que bom que você está aqui”. Como não gostar do Bloco dos Sujos?

 

(*) Mário Ananias é monlevadense, servidor público, escritor, palestrante e autor do livro: Sobre Viver com Pólio. Contato: mariosrananias.com.br/