A chefe da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) de João Monlevade, delegada Camila Batista Alves, transformou seu perfil na rede social Instagram em uma plataforma de informação pela proteção de mulheres, adolescentes e crianças. Agora chamada @protegeredenunciar, a página traz dicas para prevenir, detectar e combater os relacionamentos violentos e o abuso sexual.
Na página, a chefe de polícia responde dúvidas, reforça alertas e conscientiza o público. O A Notícia conversou com a delegada Camila Batista Alves sobre o @protegeredenunciar. Denúncias podem ser feitas pelo telefone disque 100 e disque 180 de forma anônima.
Como surgiu a ideia de criar um perfil no Instagram para abordar o tema da violência contra mulheres e crianças?
Surgiu de uma vontade de conscientizar as pessoas, de esclarecer. Eu acho que é muito pouco falado, principalmente, sobre a violência sexual contra crianças e adolescentes. As pessoas têm vergonha de falar, não orientam os filhos, não orientam as crianças sobre isso. A violência sexual contra crianças e adolescentes acontece sobretudo no seio da família, dentro de casa. Eu entendo que a orientação é muito importante. Como eu lido com isso todos os dias, eu senti uma carga emocional muito grande. Eu também tive vontade de falar sobre, de levar a informação para as pessoas, e não guardar tudo que eu via de ruim só para mim, transformando isso em utilidade.
Há quantos anos a senhora se dedica ao combate aos crimes contra mulheres e vulneráveis?
Eu atuo na Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso desde 2021.
Qual o tipo de dúvida mais comum do público sobre esses crimes? Eles sabem que estão sofrendo violência?
A dúvida mais comum é que as crianças não têm a informação sobre a violência sexual. Elas não conseguem identificar que aquilo que elas estão sofrendo é uma violência sexual. Eu vejo que isso é o mais comum. Quando os pais descobrem, quando os responsáveis identificam que a criança está sofrendo violência sexual, geralmente, é através de sintomas, mudanças de comportamento, e não de uma revelação da criança. É mais comum a criança revelar, às vezes, para uma professora, revelar para um amigo, do que revelar para os próprios pais, uma vez que essa não é uma conversa que os pais têm com as crianças. Eu vejo que as vítimas mulheres não identificam que estão sofrendo violência psicológica. Elas ainda acreditam que chantagem e humilhação fazem parte do relacionamento, que isso é normal.
Existe algum “perfil”, algum padrão do autor de crime sexual?
Não existe um perfil. Eu falo que o estuprador não tem um nome escrito na testa, senão estava fácil da gente identificar, e meu trabalho até perderia o sentido. Geralmente, são pessoas que têm a confiança da família, que têm a confiança da vítima e utilizam dessa confiança para poder praticar o abuso de forma bem silenciosa.
Como preveni-los?
A melhor forma de prevenção é conversar. É a gente falar sobre isso. É explicar para a criança, é conversar com a criança, é educá-la. Mostrar para ela o que é a violência sexual. Explicar que ninguém pode tocar nas partes íntimas. Que não existe segredo entre pais e filhos. Que a criança tem que contar tudo para o responsável. Que não existe carinho que machuque. Que ela não precisa se sujeitar a “carinhos” que não fazem bem para ela, que a machuquem.
Qual a reação das mães ao descobrir que seus filhos foram abusados?
Eu percebo que muitas mães primeiro negam. Eu acho que é uma coisa tão atroz, é uma violência tão grave, é tão sórdido, que muitas mães primeiro negam. Elas custam a acreditar que aquilo aconteceu com o filho delas. Principalmente, porque elas entendem que isso foi uma falha delas, uma falha de proteção. Então as mães geralmente tentam contradizer a criança. Se o autor for uma pessoa que tenha ainda o afeto da mãe, que seja um convivente da família, ela vai custar a acreditar que aquela pessoa teve coragem de fazer isso com o filho dela. E, depois vem a revolta, vem a fase da raiva, seguida da tristeza. Uma frustração muito grande por não ter conseguido proteger essa criança.
Quais as consequências desse tipo de crime a quem o sofre?
As crianças que são vítimas têm uma série de transtornos psicológicos e até psiquiátricos, como alterações de comportamento e no desenvolvimento sexual. É uma iniciação sexual fora do contexto apropriado, fora da época certa. E isso traz uma série de consequências que, muitas vezes, só será percebida ao longo da vida. Eu já atendi mulheres adultas que, depois de 20, 30 anos do abuso sexual, ainda não conseguiram superar essa situação. É uma situação muito grave.
Como a mulher pode detectar se está em um relacionamento abusivo?
Primeiro, que aquele relacionamento não faz bem para ela, que o companheiro não a valoriza, que o companheiro não apoia as escolhas dela, em que há qualquer tipo de violência psicológica, como chantagem, humilhação, destruição de objetos. Quando o companheiro ou o marido tem algum comportamento agressivo, mesmo que seja psicológico, a mulher pode identificar como aquilo sendo uma relação abusiva, mesmo que não aconteça a violência física. E, com isso, ela pode e deve procurar ajuda. Geralmente, uma das ações desse companheiro abusivo é isolar a mulher, para que ela não fale com outras pessoas que está sofrendo um tipo de violência. Isso já é um sinal de alerta. O ciúme excessivo também é um sinal de alerta. O ciúme jamais é o tempero do amor. O ciúme demonstra, às vezes, um transtorno mesmo. É uma coisa muito séria, que pode levar à violência. As denúncias podem ser feitas pelo disque 100 e disque 180.